Violação do sigilo profissional

Concordo em boa medida com este texto da JAD, publicado ontem no blogue 5 dias. A relação entre médico e paciente tem de basear-se na confiança plena, faz parte da nossa intimidade, da esfera privada. Quando vemos este património violado e a nossa reserva mínima de direitos devassada, não é só o cidadão visado o antingido: limita-se de sobremaneira os direitos fundamentais de todo um conjunto de pessoas - neste caso, os portadores do HIV/SIDA - que ficam potencialmente mais isolados na sua doença. Boa parte dos seropositivos vive numa situação de carência, necessitando de apoio médico. Quantos agora não hesitarão em ser totalmente transparentes numa consulta, com receio de represálias? E quantos médicos não sentirão a tentação de se defenderem face à ameaça da justiça, preferindo não saber o contexto do paciente?
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Acresce que no caso concreto de Torres Vedras a violação do sigilo médico se me afigura totalmente desnecessária, uma vez que aparentemente não se esgotaram - longe disso - outras formas menos nocivas de apurar a verdade. Ao contrário da JAD julgo que alguém que é portador do vírus da SIDA - ou qualquer outra doença transmissível - e que deliberadamente exponha outros à doença poderá ser em tese criminalizado (pese embora possa beneficiar, no caso em análise, v.g., da concorrência da culpa do lesado, que aceita ter uma relação de risco sem preservativo, ou mesmo do estado de necessidade da mulher, que a limita de sobremaneira na sua vontade e, portanto, na imputabilidade da sua conducta); a prova, porém, não pode ser obtida de qualquer forma: há limites à investigação judicial, e a protecção do sigilo de certas classes profissionais - médicos, psicólogos, advogados, sacerdotes, no fundo, daqueles que lidam com a privacidade de quem a eles recorre - é certamente uma dessas barreiras. Rodrigo Adão da Fonseca

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