'Programa de recompra' ou 'aquisição de acções próprias'?

A PT anunciou um 'programa de recompra de acções' acima do preço da OPA destinado aos accionistas que não aceitem a oferta da Sonae.com.
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Do ponto de vista financeiro, esta decisão, no curto prazo, descapitaliza a PT, na medida em que há um prémio, suportado pelos capitais próprios ou por dívida da empresa, correspondente à diferença entre o valor de cotação e o valor de aquisição prometido. A médio prazo, importa perceber se o mercado considera que, apesar desta descapitalização, e após ela ter ocorrido, a PT vale mesmo os tais 11,50: a cotação da PT, ceteris paribus, deveria descer na medida desta diminuição do valor distribuido aos accionistas. Pode o mercado, contudo, assumir que a performance bolsista da PT estaria abaixo do valor real da empresa, aproximando-se dos tais 11,50 'sinalizados' pela administração de Henrique Granadeiro? Hipoteticamente, sim; tal, contudo, afigura-se pouco provável, já que dificilmente a cotação de uma empresa que está sob uma OPA hostil - há mais de um ano, cujo fim se aproxima - dá margem a tão grandes dissonâncias entre o valor potencial e o valor real do titulo. Esta iniciativa destina-se a um grupo de acccionistas específico: Henrique Granadeiro tenta seduzir os investidores de curto prazo, no fundo, os mais sensíveis ao preço e à revisão da oferta promovida pela Sonae.com, oferecendo-lhes um prémio adicional e uma saída mais apelativa.
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Julgo que a proposta da administração da PT é, em alguns aspectos, um pouco falaciosa. Por um lado, tenho dúvidas que a PT possa adquirir acções próprias - e um 'programa de recompra de acções' dificilmente deixará de estar amarrado às regras previstas nos artigos 316.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais - para lá dos 10%. Acresce que a lei exige que haja igualdade de tratamento dos accionistas (v.g. artigo 321.º do CSC), não sendo possível discriminar uns - os que recusem a oferta - em detrimento de outros - os que aceitem vender as suas acções à SONAE. A menos que, na prática, este 'programa de recompra' se traduza numa posterior redução do capital. Convém perceber que a proposta da Administração da PT não se destina a todo o capital, mas limita-se até 16%. Ora, neste caso, a administração da PT estará a 'oferecer' a cada accionista, não 1,2 euros por acção, mas apenas até cerca de 20 cêntimos [valor oferecido (11.50) - valor da cotação (10.23) *16%].
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Esta medida, em termos de mercado e de criação de valor para o accionista, tem pouca consistência, e apenas poderá ser apelativa para seduzir os que procuram acumular ganhos de curto prazo. Os accionistas da PT que se sintam tentados por este suposto 'prémio' de 20 cêntimos devem, contudo, pensar que nada garante que a cotação das suas acções - actualmente a 10.23€ - não venha a ter uma quebra significativa caso a OPA da Sonae.com não vingue. Rodrigo Adão da Fonseca

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